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Professor Nivaldo Pilão
Aqui em nossa coluna, “Pilando a verdade com o Prof. Pilão”, dissemos que nesta semana iríamos tratar da Guerra na Ucrânia. O objetivo aqui é o de trazer subsídios para o leitor compreender como as coisas chegaram a esse ponto. Para isso será necessário voltarmos um pouco na história.
PARTE I – Como chegamos até aqui…
Antes de tudo, é preciso ressaltar que uma guerra não pode e nem deve ser defendida por ninguém, toda e qualquer guerra é absolutamente sem sentido, principalmente em se considerando o atual estado da civilização humana.
Dito isso, claro que a invasão da Ucrânia por parte da Rússia, um verdadeiro massacre, só pode ser injustificável, mas, vale perguntar: A quem interessa fazer com que um país com muito menos recursos bélicos como a Ucrânia se contraponha ao poderio militar da Rússia?
Vamos aos fatos, na tarde de 23/02/2022 o presidente Vladimir Putin anunciou o início das operações militares, com suas as tropas invadindo a Ucrânia, já são mais de 40 dias de guerra e o que vemos pela televisão, ao vivo, é um resultado já esperado, uma crise humanitária com mais de 4 milhões de refugiados, um número incalculável de mortos e desabrigados.
A invasão, segundo Putin, ocorreu com o objetivo de proteger a população de uma região separatista, de maioria russa, chamada Donbass, situada no leste da Ucrânia, que em função de novas diretrizes impostas por Kiev, com a posse do presidente Volodymyr Zelensky, permanecia em constantes conflitos. Outro objetivo era o de dissuadir a Ucrânia de entrar para a OTAN.
Na ocupação o Kremlin dominou as províncias de Gonetsk e Luhansk, que compõe a região do Donbass e as reconheceu como repúblicas independentes.
Evidentemente que por trás dessa suposta defesa dos interesses de ucranianos de origem russa na Ucrânia estão circunstâncias geopolíticas que datam do final da II Grande Guerra, mas que se acirraram nos últimos anos.
Afinal, desde então, temos um confronto declarado entre duas zonas de influência na Europa, uma criada em 1949 que envolvia a Europa Ocidental sob o comando norte americano, a OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte; e a outra, uma resposta da Rússia que 1955 criou o Pacto de Varsóvia com os países da Europa Oriental para defender os seus territórios.
Como sabemos os dois países, Estados Unidos e Rússia, foram protagonistas da chamada “Guerra Fria” que perdurou de 1945 até 1991 com a derrubada do muro de Berlim, que representava na época o fim da “cortina de ferro” que separava as duas grandes potências.
Para a derrubada do muro houve um acordo entre as duas grandes forças, no sentido de que a OTAN não faria inclusão de países do leste europeu em suas linhas e, em contra partida, a Rússia permitiria que os países que outrora formavam a União Soviética seriam mantidos como independentes.
Uma vez selado o acordo porque então agora, em 2022, as tropas russas invadiram a Ucrânia? Evidentemente porque o confronto de hoje na Europa Oriental é muito maior do que uma desavença entre a Rússia e a Ucrânia.
Trata-se de questões geopolíticas muito sérias. Segundo Putin, a OTAN comandada pelos Estados Unidos, não cumpriu o acordo firmado em 1991, se aproveitou do colapso soviético após a separação de suas repúblicas, com a Rússia ainda enfraquecida com a dissolução da união soviética, para expandir a sua zona de influência sobre países do leste europeu, e isso é fato:
A história mostra que a reação da Rússia veio com Vladimir Putin, que chegando ao Kremlin em 1991, ganhou as eleições presidenciais com o apoio da população e do parlamento, se mantendo na presidência por oito anos.
Na sequencia, entre 2008 e 2012, ele assumiu o cargo de primeiro ministro e, embora de maneira indireta, continuou dirigindo o país. Putin volta à presidência em 2012 prometendo uma Rússia forte, com presença e importância mundiais, com recuperação econômica e militar.
Um fato histórico importante é que entre 2004 e 2009 o Kremlin teve que ver a OTAN avançar sobre os países do leste europeu sem nada poder fazer, pois Putin ainda não tinha capital econômico e político para reagir.
Entretanto, em 2014, veio a resposta do Kremlin, que depois de invadir a República da Criméia, promoveu um referendo solicitando à população que votasse se queriam que a sua república autônoma da Criméia se juntasse à Rússia e, de acordo com autoridades locais, 95,5% da população votou sim, e Putin oficializou a incorporação da Criméia pela Federação Russa.
A OTAN não interviu de maneira direta na ação russa sobre a Criméia, mas, pela primeira vez depois de vários anos ela começou a aumentar sua presença militar na região, com a mobilização de tropas distribuídas por diversos países do leste europeu, principalmente na Polônia e países bálticos.
A par disso, a convivência relativamente pacífica entre a Ucrânia e a Rússia caminhava aparentemente tranquila até que, em abril de 2020, a Ucrânia elegeu como seu novo presidente Valodymyr Zelensky, que em seu discurso de posse afirmou que para poder cumprir suas promessas de campanha e combater a corrupção iria dissolver o parlamento e, principalmente afirmou que iria aproximar a Ucrânia dos países do ocidente, entraria para a OTAN e pressionaria a Rússia a desocupar a península da Criméia.
Foi o suficiente para o Kremlin “ligar o sinal de alerta” e se preparar para uma ofensiva militar, Putin reforçou o controle militar em torno da Ucrânia, enviou tropas, equipamentos e artilharia deixando tudo pronto para uma ação.
Esse é o quadro que serviu de pano de fundo para ser deflagrado o conflito, ficou claro que o Kremlin não iria admitir uma vez mais o que já vinha acontecendo desde 1999, ou seja, não ficaria só observando a OTAN expandir seus domínios sobre a Europa Oriental sem impor nenhuma barreira.
Ciente disso, Zalensky deu um ultimato à OTAN para que aprovasse o ingresso imediato de seu país na aliança, era a “autorização” que Putin precisava.
De maneira direta, Putin disse a Zalenky que caso a Ucrânia não declarasse formalmente que abriria mão de entrar para a OTAN e não desse o espaço que os separatistas pró-rússia na região de Dombass teriam direito, ele invadiria a Ucrânia para fazer valer esses objetivos.
Em resposta de Zelensky disse que não abriria mão de fazer o seu país ingressar na União Europeia e na OTAN e que pleiteava de volta a península da Criméia, incorporada pela Federação Russa em 2014.
O resultado nós já conhecemos, Putin ordenou a invasão com o objetivo de libertar os separatistas em Donbass, firmar um caminho para acessar o Mar Negro e dominar o leste ucraniano, exigindo que a Ucrânia abra mão de se filiar à OTAN, impedindo-os de instalar bases militares nas divisas da Rússia.
Isso desencadeou a série de ataques que vemos diuturnamente na TV, com o poderio militar russo impondo bombardeios a todos os pontos estratégicos que o Kremlin julga necessários dominar para levar a cabo a sua missão.
Para entender os fatos é importante ressaltar que existem várias questões geopolíticas e econômicas envolvidas nessa guerra, portanto, é sempre bom ter em mente uma frase de autoria desconhecida, normalmente atribuída a Ésquilo, dramaturgo grego – 455 aC, e ao senador americano Hiram Johnson:
“Numa guerra, a primeira vítima é sempre a verdade”.
PARTE II – Desconfiem de ambos os lados!
Afirmo isso porque nem tudo o que é noticiado, ou a forma como é divulgado, reflete a verdade, por exemplo, vejam todos os bombardeios russos sobre as cidades ucranianas, muitas delas praticamente destruídas, se Putin assim o quisesse ele também não teria bombardeado o centro de Kiev, afinal, em quais imagens são vistos soldados russos marchando sobre as cidades bombardeadas, travando batalhas campais com o inimigo? Ao que parece não é essa a guerra que o Kremlin está travando.
A OTAN, por sua vez, não pode entrar no conflito já que a Ucrânia não pertence à aliança, mesmo assim, com Biden à frente, incentivou o confronto, disseram que dariam todo o apoio econômico e militar que a Ucrânia necessitasse para lutar contra a Rússia, e conduziria os países membros da aliança a imporem uma série de sansões econômico/financeira aos russos.
Ao que parece, o que a OTAN quis, e assim o fez, foi transformar a Ucrânia em seu exercito para lutar contra a Rússia, mas sem armas…
Também ao que parece, já que como dissemos a verdade é relativa, Putin não tem interesse de tomar a Ucrânia, mesmo porque, se assim o fizesse, ele encostaria a Federação Russa na divisa com a Polônia, que pertence à OTAN e ficaria tão vulnerável quanto teria ficado caso a Ucrânia tivesse entrado para a aliança, aparentemente o desejo dele é ter um estado neutro entre a Rússia e os países da OTAN, para proteger o seu território.
Claro que são conjecturas, mas, se olhar para o mapa da guerra da ocupação russa ele sugere que a ação de Putin é no sentido de dominar as regiões que permitam ligar o território Russo à Criméia, para ter acesso livre ao Mar Negro, que por ser um mar fechado mantém o nível de suas águas sempre constante, tornando-se assim um porto altamente estratégico para importações e exportações. Os outros alvos parecem não ser o seu objetivo.
Mais um “parece” – não é só o Kremlin que enxerga essas coisas, observe-se que nos últimos anos a OTAN estaria interessada na admissão da Ucrânia com o objetivo de se aproximar fisicamente do inimigo, instalando ali suas bases militares e criando um excelente caminho para acessar o Mar Negro e lá instalar a sua marinha, coisa que a Rússia, evidentemente, não admitiria.
De outro lado nota-se também que a OTAN vem sendo observada com muita atenção por países do Oriente, já que a hegemonia ocidental não tem respeitado os interesses desses países em muitos campos: expansão comercial; dominação cultural, tais como modo de vestir, comer, agir, esportes; expansão militar com bases em todos os continentes, inclusive no Japão.
Mesmo porque, sabemos que conviver com outras potências que estão à sua frente nunca foi o forte dos EUA, que se acostumou a ser sempre o primeiro, e nesse sentido a China se apresenta como competidor à altura e na frente dos americanos em muitos campos, por exemplo, hoje ela é a fábrica do mundo.
Embora de maneira não declarada, fica evidente que a Federação Russa contou nas suas ações com o apoio de países da Ásia, em especial a China, e mesmo que em menor monta também com a Índia e a África do Sul, além de vários outros países do continente africano e do oriente médio que assim como a Rússia contestam a expansão hegemônica dos EUA sobre o mundo.
O que se discute aqui é mais do que o confronto Ucrânia x Rússia, assiste-se a uma acomodação de forças no mundo, veja a ascensão da China e do oriente.
Claro que a resolução que condenou a ação da russa na Ucrânia foi aprovada pela ONU, mas, é bom lembrar que na votação a Rússia recebeu cinco votos a seu favor e outros 35 países se abstiveram principalmente a China, a Índia e a Arábia Saudita, os demais países são em sua maioria africanos e asiáticos, o que pode ser entendido como uma reação à crescente hegemonia americana.
Quer uma prova? Os EUA e a Europa cortaram os bancos russos do sistema financeiro, logo, a Rússia não poderia mais fazer negócios internacionais, mas, em 07/04/2022, a China anunciou que assinou um contrato de fornecimento de petróleo com a Rússia, que pagará o petróleo em moeda chinesa, o Yuan e a Arábia Saudita já cogita faturar o seu petróleo também em Yuans.
Lembro que o dólar como reserva de valor e moeda mundial foi estabelecido nos anos 1970 em função da Arábia Saudita definir que iria passar a faturar o seu petróleo em dólares americanos, não deixa de ser uma ruptura…
Sobre isso, assistam no Youtube: “A guerra na Ucrânia tudo o que está em jogo” – imperdível! – https://www.youtube.com/watch?v=pcdifxPJ8aI&t=393s
O Prof. Pilão é Administrador, Mestre em Administração e Doutor em Engenharia de Produção, com mais de 35 anos de experiência na FGV, FACAMP, SUSTENTARE e no UNIFIEO, onde foi Reitor no biênio 2020/2021.